o quarto tinha uma cama:
era a placa onde
se escreveu amor
e se escreveu silêncio
medo-de-chuva
preguiça de amanhã
vontade de fazer-se
palavra magica
pir-lim-pim-pim
e ser invisível
invencível
impossível
o quarto tinha
um sol e uma lua
desaparecidos
no esconde-esconde
que nunca se acabou
[nem nunca vai]
o quarto tinha os
livros que já
não eram livros
a lua de mel
que não vingou
e fotografias
mais parecidas
a nuvens ligeiras
que o vento soprou
a frase que se perdeu
a historia que virou pó
o filme mudo
e calado
que ninguém revelou
o quarto tinha
também um moço cansado
usado por seus
esquecimentos
calejado em já
não dizer – torto dos sentidos
coxo dos desejos
um pai acovardado
machucado na
pele dos seus olhos,
em um coração mudo
aquele era um
quarto, era metade
era a beirada,
tudo, só a beirada
do que se espera
nesga do que se quer
e no canto
do quarto
uma moça como vulto
mobília e veste
esquecida
que já não
combinava
ali